“Cada vez estou mais consciente, nos últimos 10 anos mais ou menos, das mortes de meus contemporâneos. A minha geração está de saída, e senti cada morte como uma ruptura, como se parte de mim se rasgasse. Não haverá ninguém como nós quando nos formos, mas na verdade não há ninguém que seja como outro alguém, nunca houve. Quando as pessoas morrem, são insubstituíveis. Deixam buracos que não podem ser preenchidos, pois é o destino – o destino genético e neural – de cada ser humano ser um indivíduo único, encontrar seu próprio caminho, viver sua própria vida, e morrer sua própria morte.
Não posso fingir que não tenho medo. Mas meu sentimento predominante é a gratidão. Amei e fui amado; ofereci muito, e dei algo em troca; li, viajei, pensei e escrevi. Comuniquei-me com o mundo com a comunicação especial dos escritores e leitores.
Acima de tudo, tenho sido um ser senciente, um animal pensante, nesse belo planeta, e isso por si só foi um enorme privilégio, e uma aventura.”
Por Oliver Sacks, texto escrito pouco tempo antes da sua morte, ao descobrir um câncer terminal.
Lidar com a morte é o maior mistério da humanidade. Mais do que um mistério, a morte propriamente dita é um absurdo. Vivemos em primeira pessoa, todas as vivências, estímulos e ideias são experimentadas pelo foco do “eu”. Chega a ser inconcebível a percepção do morrer como “deixar de existir”, uma vez que se faz parte deste universo.
A cultura ocidental também se encarregou de aliar conceitos como fracasso, punição e perda à morte. Por isso, nos afastamos do morrer, as despedidas entre pessoas queridas tendem a ser mais tímidas, os hospitais se encarregam de isolar os doentes da sociedade. O médico que disser que lidar com a morte é fácil, ou que não se sensibiliza com a perda de um paciente, deve repensar o seu papel na profissão.
A verdade é que nosso inconsciente é atemporal. O ser humano tende a se enxergar como um ser permanente. E embora seja óbvio que todos vamos morrer, tiramos um pouco essa impermanência das nossas mentes, até mesmo para tornar a realidade mais suportável.
Às vezes, é preciso se contentar com um “não sei”. As incertezas nos movem, são incompatíveis com comodismos e falsas seguranças. Aproveitar a nossa breve existência neste planeta parece ser o mais prudente a se fazer, diante da imensidão de mistérios à nossa volta.
“Eu adoraria acreditar que quando eu morrer, eu vou viver outra vez. Que alguma parte pensante, sensível e memorável de mim continuará. Mas por mais que eu queira acreditar nisso, e apesar de antigas tradições culturais mundiais falarem sobre vida após a morte, eu não sei de nada que possa sugerir que isso é mais do que simplesmente pensamento positivo. O mundo é tão primoroso, com tanto amor e profundidade moral, que não há razão para nos enganarmos com histórias bonitas para as quais existem poucas evidências boas. Parece muito melhor para mim, em nossa vulnerabilidade olhar a morte nos olhos. E ser grato todos os dia pela breve, mas magnífica oportunidade que a vida nos dá.” Carl Sagan